quarta-feira, 23 de abril de 2008

Final - De "Fomos Maus Alunos" Gilberto Dimenstein e Rubem Alves


As conversas não tem fim. Assunto puxa assunto. Não há conclusões. Não há amarrações de conhecimento. As linhas ficam soltas... Terminamos a conversa com um comentário sobre as memorizações que temos de fazer para viver em nosso mundo. Se memorizamos códigos e senhas é porque sabemos que, sem eles, ficaríamos paralisados. Códigos e senhas são chaves. Mas, em si mesmos, não tem o menor sentido. Como o número de telefone da pessoa amada. O número não tem a menor importância. O que me importa é a pessoa amada a que o número me leva. É uma boa metáfora. Santo Agostinho dizia que tudo no mundo se divide em duas feiras. A primeira é a Feira de Utilidades. Utilidades são saberes e competências que aprendemos não por causa delas, mas por causa de outras coisas. Como é o caso do número do telefone da pessoa amada, ou da chave que abre seu apartamento. Há centenas de números de telefones. Mas só aprendemos aquele que nos conduz ao prazer e à alegria. O prazer e a alegria são grandes forças que nos levam a aprender. A segunda feira é a Feira das Fruições. Fruir é gozar, ter prazer em. Uma sonata de Mozart não me leva a nada. Um poema não me leva a nada. Um pôr-do-sol não me leva a nada. Se desejo essas coisas não é por causa de seu poder instrumental - Como acontece com os saberes da primeira feira. Quando ouço Mozart, ou leio um poema, ou contemplo um pôr-do-sol, eu já cheguei. Experimento a beleza. Não quero ir a nenhum outro lugar. Os saberes da primeira feira são ferramentas, instrumentos. Meios para chegarmos ao lugar da beleza, da alegria e do prazer. Assim, a educação se constitui de duas partes: a aprendizagem das utilidades e a aprendizagem das fruições. Os saberes da primeira feira nos dão meios para viver. Os saberes da segunda feira nos dão razões para viver. Em que ordem? Primeiro vem meu amor pela amada. É o que faz com que minha memória deseje memorizar o número do seu telefone. Primeiro o amor pelo poema. É o amor pelo poema que vai provocar a conhecer a literatura. Primeiro amor pelas estrelas e pelo enigma do universo. Será isso que me provocará a ser astrônomo... Assim, temos de perguntar: Isso que tenta ensinar é objeto de amor dos alunos? Isso que se tenta ensinar é ferramenta para que os alunos atinjam o objeto amado? Acho que esse é o resumo. Tudo o que dissemos são variações.

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Enfim, toda essa conclusão já diz tudo. O que a escola faz hoje em dia? Ela só nos dá as "utilidades da primeira feira", inúteis em si, pois não sabemos o porquê da existência delas. Por isso a inutilização freqüente da escola, acredito que cerca de 80% do conhecimento (para mais ou menos, dependendo da gravidade da escola) que lá aprendemos vai direto ao nosso esquecimento assim que nos livramos dessa simbiose. A escola, como deveria ser, não é um ambiente sagrado. A escola deveria ser sagrada, divina, um local de amor, de divisões de experiências, de amostras do por que e como o pôr-do-sol nasce, mas como algo belo, maravilhoso, vindo de uma experiência universal de forte influência sobre nós, algo divino. Mas onde está todo este amor? Aonde? A escola como existe hoje em dia só nos destrói a rouba nossas energias. Não tenho quase nenhum amor por esta instituição, pouco me resta de lá ainda, apenas alguns poucos bons professores e amigos que me ensinam muito. O conhecimento maior que tiro da escola vem fruto do ódio e sofrimento que me aflige durante o tempo que está instituição anda me afetando. Só faltam mais dois anos de trabalho árduo, me sinto um escravo a espera de uma liberdade, um meio para poder usar a minha inteligência da forma como quero, livremente e com amor, que só consigo sozinho ou em companhia de poucos e bons amigos, parentes ou namorada. Em liberdade.

2 comentários:

  1. A escola...
    Um sistema fabril de conhecimento...
    "Quanto vc tirou na prova, fulano?"
    "10"
    "Aff, que nerd!"
    "5"
    "Pq? Não estudou?"

    A escola nos trata despoticamente. Se tiramos 10 é porque somos esforçados e disciplinados (uma palavra horrível que soa bonita quando falada dentro da escola...), se ficamos abaixo da média, somos o contrário.

    Ou seja, o cara não tem escolha - estudar vira uma ferramenta de sobrevivência - parece que não deixamos de ser macacos, regidos pela lei do mais apto e do mais forte....

    Mesmo assim, "indisciplinado" como sou, continuo lendo, e deixo de lado a escola - se eu passar de ano, já está bom. Não desejo mais ser "o melhor nas notas". Querer ser "o melhor" é mais um obstáculo contra uma vida feliz.

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  2. A dias á atrás vc comentou isso comigo .
    Curioso tudo isso, e veridico também !

    A nota parece um monópolio, é ela q manda na gente e não é isso .

    Aaaah se todos pensassem como vc !

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